Texto redigido por mim e que, não necessariamente, é um fato de ficção.
Eu a vi subir umas duas paradas depois da minha. Aliás,
dentro de um ônibus as seis e meia da manhã, lotado e com muitas outras pessoas
a subir e descer durante o trajeto de quase uma hora até o meu destino, é quase
impossível deixar de notar as pessoas que sobem e descem. Mas com ela foi
diferente.
Quis chegar próximo logo de cara. Talvez perguntar as horas;
quem sabe ela me pedia para abrir alguma janela, ou coisa do tipo... Seria um
início de conversa! Mas se eu fosse lá de cara, muito provavelmente ela notaria
as minhas intenções. Afinal, essa era a atitude típica dos que possuem “tarado
de ônibus” estampado na testa, daqueles que se aproximam da moça e parecem
iniciar a prática do coito via transferência de odores. Era uma coisa não muito
bonita de se ver, e que beirava a irracionalidade. Não, definitivamente eu não
sou dessa estirpe, então tive de me aproximar com calma.
O bom de não chegar logo era que eu poderia bolar melhor os
argumentos, organizar as cenas, de repente até dava tempo de salvar uma lista
de músicas favoritas no telefone. E foi umas cinco paradas depois, cerca de 20
minutos após ela subir no ônibus que me aproximei.
Ela era linda. Os cabelos escovados se faziam dourados ao
serem banhados pelos raios do sol que entrava pela janela. Seu rosto de neve
parecia que iria derreter em uma poça delicada de perfeição, escorrendo pelos
óculos redondos que ostentava lindamente em sua fronte.
Imaginei dando bom - dia. Ora, sou um cavalheiro, e esse é o
comportamento de um! Imaginei a saudação e imaginei as possibilidades de
resposta baseados no possível humor dela para aquele momento; foi como viajar
por mundos paralelos onde, em cada um deles, a realidade se espelhava e
acontecia algo diferente. Em uma delas eu lhe perguntava as horas e recebia
como resposta um beijo cinematográfico, de fazer todos no ônibus se
entreolharem. Em outro ela me dizia as horas, recebia o número do seu telefone
e ela ia embora. Eu ligava para ela em seguida, nos encontrávamos e, dois meses depois, estávamos casados... e por ai vai.
Dei sinal.
Desci. Ela desceu junto.
Cada um foi para um lado diferente.
Nunca mais a vi.
PS: Música sugerida para acompanhar a leitura: "Duvet" (Boa)
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